
Isto é gozar com quem trabalha

Falar de educação
As editoras já preparam tabletes com capas para todos os tipos de leitores: paper touch (para os tradicionalistas), impermeável (para ler no colchão da piscina ou no banho de espuma), papel cola-moscas (para alunos renitentes), veludo aromatizado (para literatura erótica), metal carregado electro-estaticamente (para autores electrizantes). A câmara permitirá reconhecer o movimento de molhar o dedo na língua e virará automaticamente a página, detectará a expressão de desagrado e saltará as páginas que estiverem indexadas com o mesmo tipo de conteúdo e apresentará avisos para parar a leitura de forma a evitar miopia juvenil. O tablet apresentará relatórios periódicos aos pais com alarmes configuráveis. O tablet para leitores comandará a porta do frigorífico e a tampa da caixa das bolachas. As passagens que o leitor apreciar especialmente serão guardadas automaticamente e podem ser enviadas a uma lista de contactos.
https://www.sinalaberto.pt/os-equivocos-da-educacao-a-distancia/
A pandemia trouxe a educação à distância para as nossas casas. De um dia para outro, toda a gente passou a falar de educação à distância. A expressão, que já era controversa no contexto profissional onde era usada, explodiu subitamente, num fogo de artifício de interpretações coloridas e ilusórias que lhe destruíram de vez o significado. Quando hoje se discute a educação à distância a expressão já não quer dizer nada.
A ironia desta efervescência é que a dicotomia entre mundo presencial e mundo online é hoje um falso problema. Os dois mundos já não têm fronteiras. Raras são hoje as atividades individuais e sociais que prescindem das tecnologias digitais, do uso dos telemóveis, da comunicação na Net ou do acesso a repositórios na “nuvem”, onde, de resto, já se encontra armazenada a maior parte dos nossos dados.
Curiosamente, vários comentadores dos media, justamente frustrados com as restrições que a pandemia lhes impôs, passaram a reclamar, não contra a pandemia ou as restrições, mas contra a linha-de-vida que os manteve ligados ao mundo nesse período: o online. Paradoxalmente, foi online que as reclamações contra o online foram mais lidas e foi aí que foram partilhadas e aclamadas. Sem online, teriam sido gotas de água no oceano.
Sentindo que este tipo de contradição, entre o ser-e-não-ser, estar-e-não-estar, dificulta a construção serena do futuro, que nos explodirá nas mãos sob formas indesejáveis se não cuidarmos de o criar com inteligência, a Comissão Europeia lançou, há meia dúzia de anos, o projeto Onlife Manifesto, onde defendeu que assumamos o fim da distinção entre mundos online e offline e reconheçamos que vivemos uma nova ordem social, económica, política e ética no seio da qual esse tipo de distinção não tem sentido. O projeto, liderado por Luciano Floridi, professor de filosofia e ética da informação da Universidade de Oxford, deu origem a um interessante volume de reflexões publicado pela editora Springer em 2015.
O ensino remoto de emergência não poderia correr bem, nem em Portugal nem em parte nenhuma do mundo, por razões biológicas básicas: a atenção, a memória e a disciplina intelectual de uma criança têm limites que ninguém pode contornar.
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